No texto bíblico, o nome Lilith aparece apenas uma vez, em Isaías 34:14.
וּפָגְשׁ֤וּ צִיִּים֙ אֶת־אִיִּ֔ים וְשָׂעִ֖יר עַל־רֵעֵ֣הוּ
יִקְרָ֑א אַךְ־שָׁם֙ הִרְגִּ֣יעָה לִּילִ֔ית וּמָצְאָ֥ה לָ֖הּ מָנֹֽוחַ׃
“Encontrarão (verb) fera (subs) do deserto (subs)
com um chacal (subs) peludo (adj) sobre companheiro (subs) chamará (verb) porém
ali, perturbar (movimentar) (verb) Lilith (subs) alcançar (verb) para ela descanso
(subs)”. Minha tradução.
“Aí vão se encontrar o gato do mato e a hiena, o
cabrito selvagem chamará seus companheiros. Aí Lilit vai descansar”. Bíblia
Palavra Viva. São Paulo: Paulus, 2022.
“Os gatos selvagens encontrarão ali as hienas, os
sátiros ali gritarão um para o outro. E ali também se instalará Lilit: lá ela
encontrará o repouso”. Bíblia Tradução Ecumênica. São Paulo: Loyola, 1994.
“Lá se encontrarão a hiena e o gato do mato, o
cabrito selvagem chamando os companheiros, lá descansará Lilit, ali encontrará
repouso”. Bíblia Sagrada Tradução CNBB. Brasília: CNBB, 2008.
“Aí vão se encontrar o gato do mato e a hiena, o
cabrito selvagem chamará seus companheiros; aí Lilit vai descansar, encontrando
um lugar de repouso”. Bíblia Pastoral. São Paulo: Paulus, 1990.
“Demônios encontrar-se-ão com burros-centauros. E chamarão
uns pelos outros; lá os burros-centauros descansarão, pois encontraram para si
mesmos um lugar para descansar”. LOURENÇO, Frederico. Bíblia Antigo Testamento:
Os Livros Proféticos. São Paulo: Companhia das Letras, 2019.
“Nela se apertarão os espíritos, e o espírito
maligno gritará a seu companheiro; ali repousará o espírito maligno com forma
de mulher, e achará descanso”. Peshitta. Niterói/RJ: BV Filmes Editora, 2018.
“Ali se darão encontro as hienas e os chacais, e os
sátiros chamarão seus companheiros, para que ali venha a descansar Lilite, e
ache para si o lugar de seu repouso”. Bíblia Textual. Niterói/RJ: BV Filmes Editora,
2019.
“E animais do deserto se encontrarão com hienas;
bodes selvagens clamarão um ao outro; e Lilite, criaturas noturnas, pousarão
ali e encontrarão descanso e refúgio”. Bíblia King James. Rio de Janeiro: Casa
da Palavra, 2012.
Palavra
original: לִילִית
Parte do discurso: Substantivo Feminino
Transliteração: liyliyth
Ortografia fonética: (lee-leeth')
Apesar das poucas menções, para os judeus, a Torá é
a fonte para a interpretação das principais leis e da ética, já que é
considerada uma forma de revelação divina para a humanidade. Ho primeiro livro
do Pentateuco há um versículo que suscita muitas dúvidas e várias
interpretações: “E Deus criou o homem à sua imagem, à imagem de Deus o criou;
homem e mulher os criou. E Deus os abençoou, e disse: frutificai e
multiplicai-vos” (Gênesis 1.27).
Isso ocorre no sexto dia da Criação. No sétimo,
Deus descansou.
Mais adiante, conta que ele colocou “o homem que
havia se formado” no Éden, e só depois: “E disse Jeová Deus: Não é bom que o
homem esteja sozinho; darei uma ajuda idônea a ele” (2:18). Continuando, 2.21: “E
Jeová Deus fez um sono profundo cair sobre Adão, e ele adormeceu. Então ele
pegou uma de suas costelas e fechou a carne em seu lugar; 2:22: e da costela
que Deus tomou do homem, fez uma mulher e a levou ao homem”. Fica a pergunta, o
que aconteceu com aquela fêmea criada no sexto dia?
Uma interpretação é que esse primeiro ser criado
era andrógino, uma criatura que era simultaneamente homem e mulher e foi
separada depois (interessante que Platão desenvolve essa ideia em sua obra O
Banquete).
Outra leitura é de que houve duas Evas: Adão não
gostou da primeira e Deus a substituiu por outra.
Embora esta última versão tenha surgido cedo, a
associação com Lilith demorou a aparecer, apesar de ela já estar viva no
imaginário da região pelo menos um milênio e meio antes de a Bíblia começar a
ser escrita (séculos XI e V a.C).
A menção mais antiga ao seu nome aparece na Epopeia
de Gilgamesh – a mais antiga obra épica escrita – e em A Árvore
Huluppu, um poema épico sumério encontrado em uma tabuleta em Ur que remonta a
aproximadamente 2 mil a.C.
Talvez seja possível imaginar que o mito tenha feito
parte da demonologia babilônica, inclusive existe relatos de que amuletos e
encantamentos eram usados para neutralizar os poderes sinistros deste espírito que
atacava mulheres grávidas e bebês. Logo Lilith migrou para o mundo dos antigos
hititas, egípcios, israelitas e gregos.
Isso provavelmente explica por que no Livro de
Isaías ela aparece sem nenhuma apresentação, uma indicação de que o escritor
confiava que os leitores a conheciam.
Também foi mencionada no Talmude da Babilônia
(escrito por volta o ano 500), uma coletânea de discussões, relatos de grandes
rabinos e meditações sobre passagens da Bíblia. Essa Lilith talmúdica tinha cabelos longos e asas, e
encarnava práticas sexuais consideradas insalubres.
Outros
textos posteriores que incorporam Lilith na história da criação, como o Zohar,
escrito por volta de 1300 na Espanha, um dos dois livros fundamentais do
pensamento místico judaico conhecido como a Cabala. O texto afirma que essa
criatura andrógina inicial foi dividida, criando seres humanos distintos: o
homem, Adão, e a mulher, “a Lilith original, que estava com ele e concebeu dele”.’
No Alfabeto
de Ben Sirá, Lilith é a protagonista de um episódio que conta que quando Ben
Sirá foi atender o filho doente do rei Nabucodonosor da Babilônia, inscreveu em
um amuleto os nomes dos três Anjos da Saúde: Senoy, Sansenoy e Semangelof.
Quando Nabucodonosor perguntou quem eram os anjos
mencionados no amuleto, Ben Sirá contou que pouco depois de Deus criar o homem,
Adão, e a mulher, Lilith, eles começaram a discutir.
- Lilith: “Não me deitarei por baixo”.
- Adão: “Não me deitarei debaixo de ti, mas acima
de ti, porque és apenas digna de estar na posição inferior enquanto eu, na
superior”.
- Lilith: “Somos iguais, pois ambos fomos criados da
terra”.
Quando Lilith se deu conta de que não chegariam a um
acordo, ela pronunciou o Tetragrama – as sílabas sagradas do nome inefável de
Deus – e voou para longe.
Adão orou ao seu Criador e disse: “Senhor do
Universo, a mulher que me deste fugiu de mim!”
Deus então enviou os três anjos para dizer a ela
que, se não voltasse, cem de seus filhos morreriam diariamente.
Lilith, no entanto, se recusou e disse que havia
sido criada para “fazer adoecer as crianças: se são meninos, do nascimento até
o oitavo dia de vida terei poder sobre eles; se são meninas, desde o nascimento
até o vigésimo dia”.
Mas ela jurou que cada vez que visse nos bebês os
nomes ou imagens dos anjos em um amuleto, não lhes faria mal.
Essa é a versão mais conhecida da passagem de Lilith pelo Paraíso. E a mais polêmica.
Isso porque muitos estudiosos não reconhecem O Alfabeto
de Ben Sirá como uma representação do pensamento rabínico.
Alguns até o consideram uma peça deliberadamente
satírica que zomba da Bíblia, do Talmude e de outras exegeses rabínicas, pois
sua linguagem é muitas vezes vulgar e seu tom, irreverente.
O relato de Lilith em si leva a debates sobre
mitologia versus história, textos sagrados e adições não sagradas, assim como a
discussões polêmicas entre aqueles que veem a Bíblia como a palavra de Deus e
os que a veem como parte do rico acervo cultural universal que admite não só
uma história de origem, mas muitas outras.
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