Vida
José Comblin nasce em
1923, em Bruxelas. Primeiro dos cinco filhos de uma família simples, realiza
sua formação básica em humanidades clássicas e, aos 17 anos, entra no Seminário
Léon XIII (que havia sido criado pelo Cardeal Mercier para acolher de
diferentes dioceses belgas os estudantes que mais se destacaram
intelectualmente), concluindo aí os estudos de Filosofia.
Em 1944, começa seus
estudos de Teologia em Malines, entre o Seminário Saint-Joseph e o Grande
Seminário. Posteriormente realiza os estudos de doutorado em Teologia Bíblica
na cidade de Louvain. Ordenado em 1947, é nomeado vigário em Bruxelas, na
paróquia Sacré-Coeur, onde trabalha especialmente com os jovens. No período de
1950 a 1957, trabalha como professor de Escrituras Sagradas no CIBE (Centre
d’instruction pour brancardiers ecclésiastiques) em Alost, instituição para
jovens seminaristas e religiosos belgas que faziam o serviço militar em
conjunto com os estudos teológicos.
No entanto, novos planos
já eram pensados por Comblin. Em 1955, após a publicação da
Encíclica Fidei Donum, atendendo ao pedido – por parte do Cardeal Van Roye
– de padres que pudessem trabalhar como missionários, conhecendo a experiência
de seu irmão André que era religioso dos Padres Brancos na África, e com um
sentimento pessoal de falta de futuro para a Igreja na Europa, Comblin envia a
primeira solicitação de partida para a América Latina. Não obtendo resposta,
envia uma segunda solicitação em 1957, que foi finalmente aceita.
Diferentemente do objetivo de Pio XII, que era enviar padres europeus à América
Latina para lutar contra o comunismo, ele desejava antes fazer parte de uma
Igreja na qual via ainda um futuro. E Comblin cumpre seu objetivo.
Requisitado para a Igreja
de Campinas (São Paulo), Comblin inicia no Brasil, em 1957, sua caminhada como
padre e teólogo pelo continente latino-americano. Passados os primeiros cinco
anos, em que inicia ao mesmo tempo seu trabalho como professor no Seminário
Menor em Campinas e na Escola de Teologia dos Dominicanos (Studium Theologicum
dos Dominicanos) em São Paulo, recebe o convite de Marcos McGrath em 1962 para
ser professor na Faculdade de Teologia de Santiago do Chile por três anos. Ao
final desse período, convidado por D. Hélder Câmara, volta ao Brasil e, em
1965, chega ao Recife, onde desenvolverá trabalhos pastorais e acadêmicos como
professor e coordenador do ITER (Instituto Teológico do Recife) até 1972,
quando é impedido pelos militares de entrar no país. Por essa razão, retorna ao
Chile e lá permanece até 1980, sendo expulso pelo regime de Augusto Pinochet.
Dessa vez, regressa ao Brasil, onde se instalará até sua morte em 27 de março
de 2011, residindo inicialmente no Estado da Paraíba (ligado à Arquidiocese de
João Pessoa) e finalmente no Estado da Bahia, na Diocese de Barra.
Teologia
O período vivido no
continente latino-americano permitiu a Comblin entrar em contato de maneira
mais profunda com a realidade e a teologia latino-americana, que se constituía
naqueles anos como a teologia da libertação. Realiza inúmeras viagens por quase
todos os países do continente, formando uma rede de contatos com bispos e
teólogos latino-americanos ligados a essa linha teológica. Isso lhe deu a
possibilidade de participar das mudanças na Igreja da América Latina,
proporcionadas pelo Concílio Vaticano II, consolidadas pela Conferência de
Medellín e confirmadas em Puebla.
O deslocamento
geográfico, cultural, social e teológico realizado pelo nosso autor é
convergente com a consolidação da teologia latino-americana, que se constitui
fora da centralidade europeia. Esses dois fatos serão refletidos em sua obra
teológica. De suas primeiras publicações, eminentemente ligadas ao contexto
europeu, em que falava de revolução e paz, os temas foram cada vez mais
deslocados para a realidade latino-americana.
A nosso ver, essa “nova
etapa de produção”, marcada pela dinâmica da teologia latino-americana da
libertação, permitiu a Comblin revelar três características que identificam seu
fazer teológico. A primeira pode ser definida pela permanente busca inicial, ampla
e profunda, de compreensão da realidade para, num segundo momento, emitir um
discurso teológico. Se fizermos uma analogia com o método V-J-A
(Ver-Julgar-Agir) e estabelecermos uma graduação entre as três vertentes,
afirmaremos que o forte de Comblin se situa no Ver.
A segunda característica
é a centralidade antropológica, que marca sua construção teológica. Comblin
escreve e pensa sua teologia com um objetivo preciso: ajudar o homem a
transformar-se e tornar-se aquilo para que fora chamado por Deus (ser cada vez
mais humano).
A centralidade do humano
em sua obra é essencial, o que o leva a afirmar: “A humanidade não é um tema
entre os outros dentro da Teologia, mas é o tema que é central”. Na dinâmica da
teologia latino-americana, Comblin assume a compreensão do humano a partir da
opção preferencial pelos pobres. Daí em diante, abandona o projeto de oferecer
um modelo de humanidade e trabalha considerando as necessidades e demandas
humanas para, uma vez baseado em sua análise contextualizada, ter condições de
oferecer alguma reflexão teológica que possa colaborar na restauração do
respeito ao “não-homem”.
No giro epistemológico de
sua abordagem antropológica, Comblin encontra o rosto do humano que sua
teologia deve tocar: é o rosto do homem pobre latino-americano. Uma vez situado
na América Latina, Comblin assume o pobre como o protagonista bíblico, que é
definido em Puebla como “as grandes maiorias que não conseguem satisfazer suas
necessidades básicas de alimentação, saúde, habitação, educação e emprego. A pobreza
deve ser compreendida no sentido concreto e material. Não se trata de
disposições psicológicas interiores”.
Levando-se em
consideração sua história (contexto social e eclesiológico), podemos afirmar
que Comblin se encontra em uma situação peculiar que podemos dizer “de
fronteira”, ou seja, está situado entre dois contextos históricos: o europeu,
em que se formou teologicamente, e o latino-americano, em que produz sua
teologia de maneira contextualizada.
Daí decorre a terceira
característica, que neste artigo é de essencial compreensão: a obra de Comblin
é evolutiva. Sua base de formação teórica e a experiência pastoral e teológica
latino-americana lhe permitem ressituar os temas de que trata ao longo dos
anos. Ou seja, um mesmo tema pode ser retomado em períodos e épocas diferentes,
e, por estar ligado à realidade, reflete em si mesmo sua transformação.
Livros
Coleção: Espiritualidade
bíblica
Evangelizar
Evangelizar é o centro da
missão da Igreja. Mas o que é evangelizar? É anunciar e publicar a mensagem dos
evangelhos. Ora, a mensagem dos evangelhos consiste nisto: o anúncio de Jesus
Cristo. E Jesus Cristo foi o evangelizador por excelência: anunciou o advento
do reino do Pai, que é vida e liberdade para as criaturas humanas. A fonte
última da evangelização é, portanto, o Evangelho que foi anunciado por Jesus, a
mensagem que foi proclamada na Palestina por Jesus, Filho de Deus e homem
verdadeiro. Compreender o Evangelho é vivê-lo de novo, reinventá-lo a cada
situação que surge, recebê-lo como resposta a uma interrogação da vida
presente.
p. 144
A
fé no evangelho
A fé é bem diferente
daquilo que se ensinava há poucos anos. Ensinava-se que a fé consiste em
acreditar em toda a doutrina proposta pelo magistério eclesiástico. Insistia-se
muito no caráter misterioso da fé. Os dogmas eram apresentados de tal maneira
que pareciam puros mistérios incompreensíveis. A fé era justamente crer no
inacreditável. Já faz tempo que os teólogos procuraram mudar essa longa prática
catequética. A fé não é ato intelectual. A fé consiste em entregar a vida a
Jesus. Ele proclama uma nova vida, um novo mundo e convida a trabalhar com ele
nessa tarefa. A fé consiste em nos entregar a Jesus sem saber por onde passará
o caminho pelo qual nos conduz. É ato de confiança e ato que compromete a vida
toda. Pois a fé é entrar num caminho novo, desconhecido. A fé abre novos horizontes
para a vida. Não é um sacrifício: é um imenso benefício. Doravante, os
discípulos de Jesus sabem aonde vai a sua vida, qual será a sua tarefa.
p. 104
Jesus
de Nazaré
Pretendemos meditar sobre
a vida humana, simplesmente humana, de Jesus Cristo. Queremos abordar esse
Jesus de Nazaré tal como os discípulos o conheceram e o compreenderam - ou não
o compreenderam - quando caminhavam com ele pelas estradas da Galileia,
percorrendo os povoados de Israel, quando ainda não o conheciam como Senhor e
Filho de Deus. Desejamos ver esse Jesus tal como ele aparecia quando ainda não
manifestava sua relação pessoal com Deus; quando, aos olhos dos discípulos, ele
ainda era um homem, simplesmente homem.
P. 120
A
liberdade cristã
A liberdade está no
centro da mensagem cristã. Jesus é um homem livre e abre caminho para que todos
se libertem. O evangelho é o anúncio do reino de Deus, e o reino de Deus é a
liberdade dos seres humanos. A humanidade nova que Jesus anuncia é a humanidade
em que todos se ajudam a viver mais e melhor. Nas nossas chamadas democracias
se diz que a lei e a vontade dos cidadãos. Será assim na prática? Como funciona
a lei na prática? Ela serve para justificar e defender a situação atual com
todas as suas injustiças. O evangelho serve para refletir sobre a organização
política. Mas serve também para fazer a reflexão sobre a organização
eclesiástica. O direito da Igreja ajuda realmente a promover e libertar os
pobres?
p. 136
A
oração de Jesus
As orações de Jesus são o
modelo perfeito para a oração dos discípulos. Não podemos garantir que as
orações que se encontram nos evangelhos reproduzem literalmente a palavra de
Jesus, já que foram escritas pelos evangelistas muito tempo depois de
pronunciadas. Mas elas expressam a forma como a oração de Jesus foi transmitida
e entendida pelas gerações sucessivas de discípulos. Foram escritas com a
intenção de fornecer os modelos da aceitação de um desafio. Jesus deve aceitar
o seu papel profético. A fidelidade à sua missão vai até o fim. A oração é de
aceitação tanto no jardim como na cruz. É de fidelidade à sua missão de revelar
Deus aos pobres e ignorantes. A oração consiste em aceitar com confiança algo
humanamente incompreensível. É uma entrega ao Pai, para que ele realize o seu
desígnio.
p. 104
Jesus,
enviado do Pai
O tema Enviado do Pai é o
eixo do evangelho segundo João. A missão de Jesus na terra foi revelar o Pai.
João condensa toda a sua mensagem nisto: dar a conhecer o que é Deus. Deus quis
mostrar o que ele é realmente. Ele tem uma palavra que tudo diz, e essa palavra
é Jesus. A vida de Jesus na terra mostra o que é Deus: "Quem me vê, vê o
Pai". Pois Jesus não lhe dá o nome de Deus, mas o nome de Pai, o que já
anuncia a grande diferença em relação a todas as religiões do mundo. O Pai está
com Jesus e em Jesus, e tudo o que Jesus fez mostra o que é o Pai. A verdadeira
glória de Deus está na vida de Jesus, na cruz e na ressurreição. O leitor
encontrará aqui algumas meditações sobre os diversos aspectos do Pai que a vida
de Jesus mostrou. Com elas, poderemos corrigir nossos erros ou melhorar nosso
conhecimento do verdadeiro Deus, e não do Deus inventado pela imaginação ou
pela razão humana.
p. 112
Viver
na esperança
A esperança cristã está
fundada no anúncio do Reino de Deus por Jesus. O Reino de Deus já está
presente, e a própria vida de Jesus mostra essa presença. Os discípulos foram
encarregados de anunciar da mesma maneira o Reino de Deus. Não se trata de
discursos, e sim de suas vidas. Com esses discípulos, um novo mundo aparece,
uma nova humanidade. A esperança já tem uma existência neste mundo. Os pobres
são os encarregados de anunciar o Reino de Deus, pela sua vida animada pelo
Espírito. A prova da autenticidade da esperança exige que a pessoa faça
realmente a experiência da realidade da vida. Viva plenamente a vida presente
nesta terra.
p.112
O Espírito Santo no mundo
Estamos acostumados a
pensar que tudo o que diz ou faz a Igreja é obra do Espírito Santo. Mas não é
bem assim. Pensamos que entendemos os evangelhos e o que Jesus nos ensinou pela
sua vida, pelos seus atos e pelas sua palavras. Mas não é bem assim, Precisamos
que venha o Espírito para que possamos descobrir os nossos erros sobre Jesus e
o projeto de Jesus, porque sempre nos desviamos desse projeto. O projeto de
Jesus é a realização das promessas feitas a Abraão. Jesus veio para criar um
povo novo, conforme à verdadeira humanidade. Jesus envia e acompanha os seus
discípulos na construção desse povo. Para realizar essa missão, os discípulos
não recebem nenhum poder terrestre, nem dinheiro, nem poder político, nem
superioridade cultural. O poder que lhes confere o Espírito é somente a força
do testemunho. O testemunho não é imposição, não é violência, não é conquista,
mas apelo. Apelo para a liberdade. A conquista da liberdade é o sinal da
chegada do Reino de Deus.
p. 136
Coleção: Temas
de Atualidade
O
povo de Deus
Muitos acham que a tarefa
mais significativa de um novo pontificado seria restaurar a eclesiologia do
Vaticano II ressuscitando o conceito de povo de Deus. Paradoxalmente, o maior
adversário do conceito de povo de Deus foi aquela pessoa que acabava de
publicar um livro sobre "O novo povo de Deus". Os defensores
mostraram-se menos rigorosos do que os opositores. Evidentemente, ninguém podia
rejeitar abertamente um Concílio Ecumênico, mas as críticas tendiam a
relativizar o valor dos documentos, pôr em evidência as insuficiências ou as
contradições. Depressa espalhou-se o rumor de que o Vaticano II estava
superado, que fora influenciado por circunstâncias históricas que já pertenciam
ao passado, que os bispos se tinham deixado levar por emoções sem olhar
criticamente o mundo com o qual queriam caminhar. Bem depressa também a
oposição concentrou os seus ataques contra a ideia de 'o povo de Deus'. Na
realidade, muitos estavam espantados pela perspectiva de mudar alguma coisa nas
estruturas ou nas condutas tradicionais da Igreja, e temiam que o conceito de
povo de Deus fosse usado para pedir reformas. Aceitavam ideias, com a condição
de que não se tirassem delas consequências práticas. Ou então esperavam
resultados imediatos permitindo um novo triunfalismo e, quando viram que os
triunfos não chegavam, voltaram para trás.
p. 416
A
vida: Em busca da liberdade
O ensaio de pneumatologia
de José Comblin, que se completa com este livro, procura sondar o que faz o
Espírito Santo no mundo a partir de cinco temas bíblicos fundamentais
relacionados a ele e nos quais se concentra o seu agir no mundo: o agir ou a
ação, a palavra, a liberdade, o povo de Deus e a vida. Se nos perguntamos:
"o que faz o Espírito Santo?", a resposta é: ele dá vida, liberdade,
dom da palavra, força para agir e cria o povo de Deus.
p. 184
Vocação
para a liberdade
Este livro parte de uma
encruzilhada em que convergem quatro preocupações. Em primeiro lugar, na
América Latina, os movimentos de libertação descobriram a liberdade. Acabou o
conflito ideológico entre liberdade de libertação descobriram a liberdade.
Acabou o conflito ideológico entre liberdade e libertação. A teologia cristã da
liberdade pode iluminar e orientar a busca de uma nova teoria da libertação. Em
segundo lugar, desde a década de 80, a Igreja latino - americana anda buscando
uma identidade perdida. Teve identidade clara nos tempos de Medellín e de
Puebla. Logo em seguida, essa identidade dói diluindo - se e, na atualidade,
parece ter -se perdido. Consciente ou conscientemente, muitos trabalham como se
quisessem refazer a cristandade, procurando apagar trinta anos de história. Em
terceiro lugar, durante, durante séculos, o evangelho permaneceu muitas vezes
recoberto por revestimentos culturais que ocultavam aspectos importantes. No
segundo milênio, sobretudo a partir do século XIV, o evangelho da liberdade
ficou quase esquecido diante do triufo de um catolicismo clerical, patriarcal, verticalista
e de inspiração imperial. Esse tipo de catolicismo foi enfrentado pelo Vaticano
II, que não pôde vencê-lo. Em quarto lugar, muitos católicos estão cada vez
mais coscientes de que não se pode anunciar o evangelho da liberdade, isto é, o
evangelho que proclama a vocação humana para a liberdade.
p. 319
O
Caminho: Ensaios sobre o seguimento de Jesus
Neste ensaio, Comblin
trata não da religião, mas do caminho de Jesus. Este é um dos mais belos livros
de já li.
Comentário
Bíblico Latinoamericano
José Comblin, um dos principais
idealizadores do projeto. Comentário sobretudo prático, pastoral, e que reforça
a caminhada dos pobres.
Atos
dos Apóstolos.
Epístola
aos Colossenses e Epístola a Filêmon.
Epístola
aos Efésios.
Epístola
aos Filipenses.
Segunda
Epístola aos Coríntios.
Livros
em Homenagem a José Comblin.
Padre José Comblin. Uma vida guiada pelo Espírito
Monica Maria Muggler
A vida do profeta José Comblin narrada por Monica Maria Muggler que compilou e organizou em livro a história viva e provocante. Ela também missionária que se tornou nordestina e disponível para o que fosse julgado mais necessário para o processo de evangelização estilo Vaticano II.
Dom José Maria Pires
Título: Padre José Comblin. Uma vida guiada pelo Espíritoítulo:
Assunto: Biografia, teologia da Libertação, projeto de Jesus
Autora: Monica Maria Muggler
Formato: 17x24
Número de páginas: 256
Editora: Nhanduti Edito
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