Sinopse
Se o judaísmo e, em
seguida, o cristianismo e o islã proclamam a unidade de um deus reinando
sozinho, desde toda a eternidade, sobre o céu e a terra, a própria Bíblia
Hebraica dá testemunho, para quem a lê com atenção, de suas raízes politeístas.
De fato, o “deus de Abraão” ao qual se referem as três religiões do Livro, cada
uma à sua maneira, não foi único desde sempre. Como é que um deus entre os
outros se tornou Deus? Eis o enigma que este mergulho nas fontes do monoteísmo
se propõe elucidar, percorrendo, ao longo de um milênio, as etapas de seu
desenvolvimento. De onde vem esse deus e por que viés se revelou ele a
“Israel”? Quais eram os seus atributos e qual era o seu nome antes de se tornar
impronunciável? Quando chegou ele à situação de deus tutelar dos reinos de
Israel e Judá? Sob que formas era venerado e representado? Por que decaíram as
outras divindades, ao lado de quais ele reinava? No fim de que processo e em
reação a quais acontecimentos se impôs o culto exclusivo que, progressivamente,
lhe foi dado? À luz da crítica histórica, filológica e exegética, e das mais
recentes descobertas da arqueologia e da epigrafia, Thomas Römer responde a
essas questões com uma pesquisa rigorosa e apaixonante sobre os traços de uma
divindade da tempestade e da guerra erigida, depois da “vitória” sobre as suas
rivais, em deus único, universal e transcendente.
Introdução
Na paisagem religiosa da
humanidade, o judaísmo é considerado a mais antiga religião monoteísta,
professando que só existe um deus que é, ao mesmo tempo, o deus específico do
povo de Israel e o deus de todo o universo. Essa ideia de um deus único
difundiu-se, depois, no cristianismo e no islã, que a expressam cada um à sua
maneira. Ao lermos as Bíblias judaica e cristãs,1 bem como o Corão, tem-se a
impressão de que esse deus esteve sempre lá, pois é ele o criador do céu e da
Terra. Mas, olhando mais de perto, encontramos textos que admitem a existência
de outros deuses, como naquela história do conflito entre um tal de Jefté,
chefe militar de uma tribo israelita, e Seon, rei dos vizinhos de Israel a
leste, que foi relatada no livro dos Juízes. Para resolver o conflito
territorial, Jefté utiliza um argumento teológico: “Não possuis o que Camos,
teu deus, te fez possuir? E tudo o que o Senhor, nosso Deus, nos entregou em
posse, não o possuiríamos nós?” (Jz 11,24). Aqui, o deus de Jefté é considerado
como o deus tutelar de uma tribo ou de um povo, à semelhança de Quemós, o deus
tutelar de Seon. Continuando a leitura da Bíblia hebraica,2 descobrimos outros
textos curiosos. Os destinatários do Deuteronômio são, por exemplo, muitas
vezes exortados a não seguir outros deuses, sem que a existência, ou seja, a
realidade deles, seja negada. Assim, a Bíblia guarda traços da existência no
Levante, até mesmo em Israel, de uma pluralidade de divindades e de que o Deus
de Israel, cujo nome se pronunciava talvez Javé ou Yahou (questão que será
abordada no primeiro capítulo), não era, de modo algum, o único deus a ser
venerado pelos israelitas.
16X23
p. 256
Paulus
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