Para Bultmann, a
questão sobre Jesus e Paulo é representativa de um assunto teológico mais
amplo, a saber, a relação entre o Jesus histórico e a pregação da igreja. Em
1892, em seu protesto contra as explicações liberais da vida de Jesus – em que
se procurava substituir o Cristo da fé da igreja por um Jesus fraco,
historicamente incerto e teologicamente irrelevante –, M. Kähler insistiu
vigorosamente nesse assunto. Bultmann tinha a mesma convicção que Kähler,
segundo a qual se deve aplicar ao método teológico o princípio reformado da
justificação pela fé: verdades teológicas jamais podem ser validadas pelos
resultados limitados e inseguros da pesquisa histórica; elas são alcançadas
apenas pela fé. Por isso, a teologia cristã jamais poderá ser confinada às
reconstruções provisórias do Jesus histórico elaboradas pelos estudiosos ou
mesmo tomá-las como seu ponto de partida. O ponto de partida é sempre o
querigma – o Cristo crucificado foi ressuscitado dos mortos e deve ser
reconhecido como Senhor.
Bultmann acreditava que,
por não haver em Paulo referências à vida e ao ensino de Jesus, a única coisa
acerca do Jesus histórico significativa para a pregação e a fé da igreja era
que Jesus, o crucificado, foi um fato histórico. Tudo o mais que fosse
teologicamente importante a seu respeito foi estabelecido pela ressurreição e pela
pregação da igreja, não pelos fatos e acontecimentos da vida histórica de Jesus.
A importância do Jesus histórico para a fé foi simplesmente que ele viveu, não
como ele viveu.
Na teologia de Paulo,
“não se obtém conhecimento acerca do Messias: ou a pessoa o reconhece ou o
rejeita” (Bultmann, 1929, p. 236). Se Jesus é mestre ou exemplo, isso ocorre
somente por já ser reconhecido como Senhor – “não é o caráter exemplar do Jesus
histórico que o torna Senhor” (Bultmann, 1929, p. 239). Dessa forma, Bultmann considera
teologicamente suspeito o clamor radical: “Deixar Paulo para trás e voltar-se
para Jesus”. “Tudo que se pode fazer é ir a Jesus por meio de Paulo, ou seja,
Paulo indaga à pessoa se ela está desejosa de entender o ato de Deus em Cristo
como o acontecimento que resolveu e resolve a questão acerca do mundo e de nós”
(Bultmann, 1936, p. 201).
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